Álvaro Regiani e Kenia Gusmão Medeiros

 

OS SIGNIFICADOS HISTÓRICOS DOS DISCURSOS DE TERRITORIALIZAÇÃO DA FILOSOFIA E A PERMANÊNCIA DA COLONIALIDADE PELA AFIRMAÇÃO DAS FRONTEIRAS DO PENSAR


 

Introdução

                        


[Fig. Nilufer Demir/DHA, 2015]

 

Em 2015 a fotografia de Nilufer Demir correu o mundo quando registrou a imagem de uma criança síria encontrada morta numa praia da Turquia. Segundo a Agência da ONU para refugiados (ACNUR), de 2013 até 2019, a Guerra da Síria produziu 6,6 milhões de refugiados e cerca de 80% encontraram abrigo na Turquia e no Líbano [ANCUR, 2020, p. 1]. Em entrevista para a rede de notícias inglesas BBC, a fotógrafa disse: “eu nunca acreditei que uma foto poderia causar esse impacto” e completou esperançosa “eu gostaria que isso mudasse o curso das coisas” [GUNTHER, 2015, p. 1]. A imagem choca, entristece, constrange ao descortinar a solidão do corpo frágil, o drama de uma infância interrompida pela guerra, pela negação de ajuda humanitária, pela valorização das fronteiras antes da vida. A criança morta entregue pelas águas do mar Mediterrâneo, o mesmo de tantas rotas marítimas que estabeleceram contatos e rivalidades entre mundos distintos, é a representação do problema moral e ético que inclui também a escrita da História.

Dentre as várias causas dessa tragédia, uma delas pode ser atribuída ao desinteresse de alguns Estados em reconhecer como necessidade a proteção dos refugiados. Em tese, os Estados nacionais mantêm o controle sobre os meios de entrada e saída de pessoas em seus territórios e o ato de imigração sem o aval estatal, isenta-o de culpabilidade. Nos termos do direito positivo, a soberania do Estado é o “controle sobre a população e o controle sobre o território”, mas como o imigrante não é um cidadão desse Estado ele é considerado um “não-sujeito” [REIS, 2007, p. 210].

Alguns Estados tem medidas políticas de controle do fluxo migratório, mas na maioria dos casos, a ausência de salvaguardas internacionais soma-se a má vontade de autoridades públicas e políticas e impedem a observância dos direitos fundamentais. Mesmo com as ações de ONGs e de voluntários para se evitar crises similares, ainda não há uma agenda internacional um medidor eficaz para pôr fim as migrações forçadas, apenas normativas de organismos internacionais para minimizar a violência contra os refugiados. Neste sentido, as interdependências assimétricas entre as nações são as principais causas dos conflitos bélicos, econômicos e sociais que resultam no aumento constante da mobilidade forçada. Conforme a filósofa emigrada Hannah Arendt argumentou décadas antes da crise humanitária na Síria, “a principal razão em função da qual a guerra ainda está entre nós” é que não surgiu um “árbitro último nos negócios internacionais” [ARENDT, 2010, p. 20].

Hananh Arendt que sofreu com o desterramento de milhões de pessoas durante a Segunda Guerra Mundial, presenciou a falência dos tratados internacionais e o declínio do Estado-nação frente ao nazifascismo. Em seu livro Origens do totalitarismo (1951), Arendt deixava claro que não acreditava ser crível o surgimento um “governo mundial” que pudesse por fim a dominação estrangeira ou limitasse a soberania dos Estados, caso o sistema internacional continuasse com as mesmas relações políticas anteriores a emergência do Estado total. Para a filósofa, haveria a necessidade de refundação do espaço político a partir do “direito de cada individuo de pertencer à humanidade”, “garantido pela própria humanidade” como um “direito de ter direitos” [ARENDT, 2009, p. 332].

Hannah Arendt também deixou claro que as ideologias contidas no sistema totalitário, como o racismo que foi fundamentado em uma suposta superioridade euro-cristã e as leis da história que conduziriam o povo germânico para “conhecer os mistérios todo o processo histórico – os segredos do passado, as complexidades do presente, as incertezas do futuro – em virtude da lógica inerente de suas respectivas ideias” [ARENDT, 2009, p. 521]. Para filósofa, as deformações das ideias de  Natureza e História como forças sobre-humana constituíam-se como elementos estruturantes de um projeto que orquestrou campos de extermínio e produziu milhões de desterramentos.

Infelizmente, essas ideias continuam a persistir, mesmo em outros formatos. No livro “O que é a filosofia?” (1991) de Gilles Deleuze e Félix Guattari, especificamente no capítulo Geo-filosofia, os filósofos abordam um retorno da filosofia da história para delimitar uma terra da filosofia, como uma condição a priori para o pensar filosófico, pois este “se faz antes na relação entre território e a terra” em “um solo para o pensamento” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 113].

Quando Deleuze e Guattari retomam as assertivas do “Milagre grego” para justificar que “os filósofos são estrangeiros, mas a filosofia é grega” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p.115], eles aderem a um sentido geopolítico iniciado pela filosofia da história de Hegel. Cujo efeito de deformação da realidade construiu um mito de fundação de autogeração da Europa nos oitocentos. Neste âmbito, pretende-se compreender como foi elaborado discursivamente a inferiorização do Oriental frente ao Ocidental no argumento dos dois filósofos franceses quando definiram estágios de “territorialização”, “desterritorialização” e “reterritorialização” para explicar “o que é a filosofia”.

Assim, anseia-se problematizar a invenção do mito de fundação da filosofia, tal qual a de invenção do Oriental para criticar e refletir sobre uma tradição intelectual que ainda desumaniza e, em certa medida, contribui para a continuidade de tragédias que envolvem os refugiados.


A territorialização da filosofia

O pensar filosófico é uma forma de refletir sobre o mundo que nos cerca, mas não é um privilégio de um povo. Como os seres humanos são pensantes, há diversas formas de pensar e produzir filosofias que correspondem a realidades distintas. As afirmações de que existe somente uma forma de pensar filosófico negam a existência de uma pluralidade epistêmica e guardam correspondências com um sentido universalizante e autocentrado, tal qual a filosofia da história de Hegel, Heidegger, Deleuze e Guattari. 

O “Velho Orientalismo” escrevia Edward Said “mesmo quebrado em muitos pedaços”, ainda serve na contemporaneidade [SAID, 2007, p. 380].  A “consistência discursiva” na invenção do Oriente pelo Ocidente “não tem apenas história, mas uma presença material (e institucional) para mostrar por si mesma” [SAID, 2007, p. 365]. Hegel como exemplo desse ‘Velho Orientalismo’ representava o Oriente como tirânico e marcado pela incapacidade de filosofar: “O sereno céu jônico, certamente, muito contribuiu para o encantamento das poesias homéricas, porém, ele não pode, sozinho, criar Homeros – e, de fato, não os tem criado, pois sob a dominação turca não surgiram poetas” [HEGEL, 1999, p. 73]. Said não acreditava em uma “essência oriental” tirânica, a-filosófica ou a-histórica mas, entendia como estas representações operavam a favor da manutenção da colonialidade europeia.

Segundo Hegel, o “fundamento geográfico da história universal” definia que a filosofia estava “ligada ao tipo de caráter do povo filho dessa terra” [HEGEL, 1999, p. 73]. Nesta lógica, havia uma geofilosofia que produzia um efeito de ordenamento da consciência reflexiva-filosófica e da história que foi reutilizada por Deleuze e Guattari: “Em resumo, a filosofia se reterritorializa três vezes, uma vez no passado sobre os gregos, uma vez no presente sobre o Estado democrático, uma vez no porvir sobre o novo povo e a nova terra. Os gregos e os democratas se deformaram singularmente neste espelho do porvir” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, pp. 142-143].

A defesa de Deleuze e Guattari dessa tradição filosófica não demarcou a existência espiritual de um povo ou de uma terra, bem como um sonho utópico ou um princípio orientador e sim uma realidade política que inventou o Oriente e é constantemente atualizada nas relações norte-sul. Ou seja, o  aspecto discursivo que legitima o contemporâneo, burocrático e financeiro que foi mantido mesmo com a descolonização afro-asiática, como um elemento estratégico nas relações norte-sul. O problema deste argumento é o uso ideológico que reivindica através da filosofia “uma” civilização e “um” povo como condutor do tempo e da razão humana, mas que reduz o Oriente a um estágio primitivo.

Segundo a filosofia da história hegeliana há uma marcha racional do espírito universal em diversos estágios temporais até a sua conciliação com o absoluto na história. Todo estágio seria parte de um grande processo universal, com um início (aurora) e um fim (crepúsculo), e ao fim de cada etapa há o surgimento da verdade histórica e do sentido que esta revelou. Além do sentido da marcha temporal há ainda no hegelianismo uma direção geográfica que partiu do Oriente para o Ocidente: “Na Ásia, deu-se o surgimento de todos os princípios religiosos e políticos, mas foi na Europa que esses princípios desenvolveram-se” [HEGEL, 1999, p. 90].

O problema é que na filosofia da história de Hegel o “começo” é sempre abstrato e/ou incompleto, pois o sentido da verdade ainda não se revelou a consciência. “Assim como a Europa é o centro e o fim do velho mundo e o Ocidente absoluto”, argumentou o filósofo, “a Ásia é o Oriente absoluto. Foi na Ásia que a luz do espírito – e assim a história universal – nasceu” [HEGEL, 1999, p. 88]. Mesmo com os problemas dessa geofilosofia de Hegel, Deleuze e Guattari a mantém e reforçam a importância do território grego e da Europa ocorreu porque o Oriente “ignora o conceito [filosófico] porque se contenta em fazer coexistir o vazio mais abstrato e o ente mais trivial, sem nenhuma mediação” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 123].

Em termos claros, para esses filósofos o desenvolvimento e a consciência estará sempre no Ocidente, pois “são [os gregos] os primeiros a captar o Objeto numa relação com o sujeito: tal qual seria o conceito, segundo Hegel” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 123]. O Oriente representado por Hegel e, posteriormente por Deleuze e Guattari, apresenta-se como uma terra habitada por entes não-pensantes, sendo a-filosófica, a-histórica e, profundamente, tirânica: “O milagre grego é Salamina, onde a Grécia escapa ao Império Persa” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 116]. Nesta proposição, a Europa como duplo-oposto do Oriente seria a terra do pensamento e do milagre grego que construiu na relação entre o território e a terra para que o pensamento filosófico, a história, a democracia e o devir pudessem vir ao mundo em uma: “nova sociedade de irmãos ou de camaradas que retoma o sonho grego e reconstitui a dignidade democrática” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 219].

O que transparece neste discurso de universalização democrática nada mais é do que a manutenção da colonização pelo saber através da homogenização das identidades e, por consequente, a impossibilidade de contrapor o modelo de governabilidade europeia. Esse saber colonizado vai do reconhecimento do poder das narrativas de origem e naturaliza a violência epistêmica por meio da compreensão que existe somente um sentido de filosofia, um de política e um de história. Mas, além da defesa de Hegel, Deleuze e Guattari retomam a filosofia de Heidegger (que não escapa a marcha iniciada pelo hegelianismo), para argumentarem que: “o Oriente não está antes da filosofia, mas ao lado, por ele pensa, mas não pensa o ser” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 124].

Nesta lógica, Hegel, Heidegger, Deleuze e Guattari apresentam uma noção de história universal (europeia) que silencia o Oriente por definir que o pensar filosófico está atrelado ao nascimento da filosofia dado que a “filosofia se confunde com sua própria história” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 124]. Em sentido claro, a invenção do milagre grego é uma expressão ideológica do colonialismo do saber.

A questão que se coloca é, quando filósofos euro-cristãos ocultaram os saberes filosóficos orientais e negaram a condição de pensar filosófico para que homens e mulheres, legitimaram as missões civilizadoras dos oitocentos e novecentos. Mas, quando Deleuze e Guattari, já na década de 1990, reafirmam a existência desse milagre grego rearranjam o projeto civilizador, mas por outros termos, a “democracia colonizadora”: “Os gregos tiveram a iniciativa, o imperialismo democrático, a democracia colonizadora. O europeu pois se considerar, não como um tipo psicossocial entre os outros, mas como o Homem por excelência, assim como o grego já o fizera, mas com muito mais força expansiva e vontade missionária que o grego” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 127].

A obsessão pela origem e a estigmatização do não-europeu pela territorialização estrutura uma hierarquização assimétrica pelo saber filosófico e demarca a principal diferença entre “quem” pensa e quem não pensa, inventando assim um Oriente passível de ser domesticado pelo saber europeu: “Pode-se falar de uma “filosofia” chinesa, hindu, judaica, islâmica? Sim, na medida em que o pensar ocorre sobre um plano de imanência que pode ser povoado de figuras tanto quanto de conceitos. Este plano de imanência, todavia, não é exatamente filosófico, mas pré-filosófico. Ele é afetado pelo o que povoa, e que reage sobre ele, de modo que só se torna filosófico sob o efeito do conceito. (…) Para que a filosofia nascesse, foi preciso um encontro entre o meio grego e o plano da imanência do pensamento” [DELEUZE; GUATTARI, 2007, p.122].

Desse modo, a existência de um único modo epistêmico de filosofia, mesmo que em suas três territorializações, autoriza uma expansão desta epistemologia de forma análoga a busca por novos mercados. Mesmo que Deleuze e Guattari tenham criticado a universalização do capitalismo, “se não há Estado democrático universal é porque a única coisa que é universal no capitalismo é o mercado”, os dois filósofos franceses não escaparam a lógica de inventar um outro, o Oriental, para continuarem imaginando a existência de um povo que escapa a barbárie e leva a civilização [DELEUZE; GUATTARI, 2007, pp. 142-143].

Todavia Deleuze e Guattari foram dois grandes expoentes da liberdade e do espírito de maio de 68, mas que se viu apagado pela onda conservadora ao longo dos anos 80 e 90. Conforme explicou o historiador Eric Hobsbawm, com a queda do Muro de Berlim em 1989 “pela primeira vez em dois séculos, faltava inteiramente ao mundo [Europeu] da década de 90 qualquer sistema ou estrutura internacional”. Além disso, surgiu “dezenas de Estados territoriais sem qualquer mecanismo independente para determinar suas fronteiras” com a dissolução da URSS e o “único Estado restante que teria sido reconhecido como grande potência, no sentido em que se usava a palavra em 1914, eram os EUA” [HOBSBAWM, 2002, p. 538].

É importante destacar que o imperialismo europeu não terminou com os processos de descolonização africana e asiática, em especial na França, pois o vínculo com as antigas colônias manteve-se e desempenham um papel estratégico nas relações norte-sul guiados pelos Estados Unidos. Mesmo distante da defesa do imperialismo oitocentista ou do financeiro, a ‘democracia colonizadora’ como colonialismo epistêmico cria um valor negativo para o não-europeu que reproduz a lógica territorial do mundo globalizado. Em termos conceituais, as fronteiras espaciais são por definições aquilo que é próprio e reconhecível, neste espaço há delimitações jurídicas e soberanas. Mas, o duplo aspecto da fronteira espacial que se dá através de uma determinação temporal em um uso da história é um recurso para se construir o “paradigma identitário pautado pela narrativa da autoctonia nacional” [ALVES; AMARAL, 2020, p. 315], representadas nas filosofias europeias pelo nacionalismo ou pelo eurocentrismo.


Considerações finais

A Grécia utilizada como exemplo nos argumentos de Deleuze e Guattari não era um Estado nacional, pelo menos não era no final do século VII a.C. quando Tales de Mileto nasceu. Reconhecido pela tradição europeia como primeiro filósofo, um dos sete sábios orientais, ele definia a “água” como princípio (arché) e causa de todas as coisas que “se conserva sempre e da qual todas as demais coisas são geradas” [ARISTÓTELES, 2012, p. 48 (983b15)]. 

Conforme interpretou o historiador Jean-Pierre Vernant, a filosofia da natureza (phýsis) iniciada por Tales não se resumia apenas a encontrar um princípio físico, mas também a conduzir uma política (arché) “de maneira direta com o universo espiritual” para “definir a ordem da cidade” [VERNANT, 2008, p. 115]. Assim, o conceito filosófico de Tales era tanto um princípio (arché) de todas as coisas quanto aspectos da soberania para a condução política (arché): “imanente à physis, a grande lei que rege o universo devia estar já presente de alguma maneira no elemento original de que o mundo surgiu pouco a pouco” [VERNANT, 2008, p. 122].

Tal qual Heródoto investigou, Tales tinha seus ancestrais “originários da Fenícia” (atual Líbano) e a cidade de Mileto, na época era uma colônia da Ásia Menor e estava sendo disputada por gregos e persas. No âmbito circunscrito as colônias jônicas, Heródoto descreveu que a cidade de Mileto não lutou contra os Medos e Persas, pois já haviam jurado fidelidade ao Imperador Ciro da Pérsia. Mas, antes da dominação persa, Tales havia proposto uma solução para os jônicos, fugir para outra região e fundar “um conselho geral para toda a nação, sem prejudicar o governo das outras cidades, as quais continuariam seguindo seus usos e costumes particulares, como se fossem outros tantos estados separados” [HERÓDOTO, 2019, (CLXX)].

Talvez o conselho de Tales sobre ‘um conselho geral’ ainda guarde significados no hodierno para reverter a questão dos refugiados, mas ressignificados e conduzidos por dois princípios contemporâneos. O primeiro de autonomia e respeito que Edward Said formulou, “na noção secular de que o ser humano deve criar sua própria história” em vez de abstrações “que vêem culturas com desprezo e descaso” [SAID, 2007, p. 23]. E na “importância política do pensar”, como argumentou Hannah Arendt, “isto é, do significado e das condições do pensar para um ser que nunca existe no singular, e cuja pluralidade de essência está longe de ser esgotada com simples acréscimo de uma relação Eu-Você” [ARENDT, 2008, p. 461]. O reconhecimento de um direito a ter direitos como premissa política permite estabelecer salvaguardas aos limites das fronteiras soberanas e, principalmente, possibilitam que mesmo que na condição de apátrida os seres humanos ainda pertençam a história, ao mundo e a humanidade.

 

Referências

Álvaro Regiani é Mestre em história, doutorando em história pela UFG e professor de História das Américas e das Áfricas na UEG – Campus Nordeste.

Kênia Gusmão Medeiros é Doutora em história pela UFG e professora de História no IFG.

 

ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. Tradução Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das letras, 2009.

ARENDT, Hannah. Sobre a violência. 2º ed. Tradução André de Macedo Duarte. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2010.

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Tradução de Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Muñoz. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2007.

GUNTHER, Joel. ‘Nunca imaginei que uma foto pudesse ter esse impacto’, diz fotógrafa que ciclou menino sírio. BBC, Brasil, 4 de set. 2015. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150901_foto_alan_kurdi_lk acesso em 03 de mar. 2020.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Filosofia da história. Tradução Maria Rodrigues e Hans Harden. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: O breve século XX (1914-1991). Tradução Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das letras, 2002.

REIS, Rosana Rocha. Migraçoes internacionais, desenvolvimento e justiça global. In. BRANDÃO, Gildo Marçal; LIMA, Marcos Costa; Reis, Rosana Rocha (Orgs.). Regionalismos, democracia e desenvolvimento. São Paulo: Humanitas, 2007.

SAID, Edward. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. Tradução Rousara Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

UN. ANCUR. Dados sobre refúgio. 18 de jun. 2020. Disponível em https://www.acnur.org/portugues/dados-sobre-refugio/Acesso em 04 de Ago. 2020.

 

16 comentários:

  1. Olá professor Álvaro! Muito bom o seu artigo, porém, não consegui captar muito bem a relação de formação histórica dos estados nacionais, independência e, conflitos, com o desenvolvimento da filosofia e, desta última com as políticas internacionais oriundas de um globalismo focado na aproximação digital e resolução de conflitos a partir de tratados internacionais.
    para ser mais simples eu pergunto: os conflitos de hoje entre as nações medio-orientais, são consequência de sua emancipação? dos seus próprios governos? de uma tensão entre Ocidente e Oriente? ou do desenvolvimento conceitual filosófico? para a última existe uma resposta muito interessante, o marxismo é amplamente estudado na china e, corresponde a uma análise epistemológica muito melhor que a ocidental.

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    1. Olá Allef Santos. Muito obrigado pela leitura e pelas as considerações. Eu e professora Kenia, expressamos no nosso texto que há vários elementos constitutivos do imperialismo oitocentista, um deles foi a invenção da origem da filosofia, como um milagre grego, o que acarretou várias formas de preconceitos que produziram de subjetividades opressoras e oprimidas. Com o fim das relações norte-oeste no fim da década de 1980, a reutilização desse argumento de reterritorialização da filosofia na Europa, em um momento de monopólio das conduções internacionais pelos Estados Unidos e de enfraquecimento da França, fez com que a retomada dessas estratégias discursivas indicasse como ainda é forte essa estratégia discursiva do mito filosófico e de como ainda serve ao imperialismo. Lembre-se que o texto de Deleuze/Guattari é do inicio dos anos noventa em paralelo com a expansão da globalização. Em resposta os conflitos no oriente são decorrentes do imperialismo, antes europeu e agora norte-americano.
      Álvaro Ribeiro Regiani

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    2. Como vai Allef? Apesar da sua pergunta ter sido direcionada ao professor Álvaro, como co-autora do texto, preciso responder. Os conflitos e tensões que envolvem disputas nacionalistas e de território, seja no que se convenciona como Oriente ou no que se denomina Ocidente, envolvem fatores internos e fatores externos. Sendo assim, tais conflitos envolvem concepções históricas, autopercepção dos povos, representações exteriores, questões políticas, econômicas e militares. Enfim, conflitos com dimensões atreladas a processos históricos, não sendo possível, portanto, tratá-los como consequência de um ápice político que, por sua vez, envolve outras redes discursivas e de poder. Nesse sentido, a filosofia, como parte do mundo cultural, também pode ser mobilizada enquanto discurso para construção de si e do outro.

      Kenia Gusmão Medeiros

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  3. Olá, professores!
    Parabéns pelo artigo, gostei muito da temática.
    Mas trazendo para o meio escolar, você acha que falta uma formação mais abrangente dos professores de História, para que os mesmos em sala de aula venham desconstruir a afirmação hegemônica que propagam uma única forma de origem do saber, o grego?
    Que acaba anulando a pluralidade de saberes que surgem e se propagam de acordo com suas culturas e particularidades, como os do Oriente.

    Alvanir Ivaneide Alves da Silva

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    1. Olá Alvanir Ivaneide Alves da Silva, obrigado pela leitura e pelas considerações. Acredito que no ensino de história há várias formas de leituras críticas do passado. A primeira é desconstruir essa noção de "gregos" vivendo em uma unidade etnica-social e apresentar a hélade como espaço intercultural. Em um segundo momento deve-se trabalhar que a Grécia apresentada, sobretudo, pelas mídias é uma invenção formada a partir do século XIX com propósitos explícitos de recriar um passado para legitimar a formação do Estado-nação e justificar o imperialismo. Por fim, deve-se apresentar que o trânsito no mediterrâneo não era, exclusivamente, comercial mas que várias saberes surgiram e foram ressignificadas por diversos povos como o alfabeto e o uso de moedas,por exemplo, mas que esses conhecimentos não eram valores que possam ser atribuídos como uma identidade de um único povo.
      Álvaro Ribeiro Regiani

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    2. Obrigada, Alvanir. Como vai você? Eu Acho sua pergunta importantíssima, por se relacionar com o ensino. Acredito que a ampliação dessa desconstrução passa sim pela formação docente inicial e continuada, nesse sentido, as coisas tem avançado, mas ainda há muito a fazer. Além disso, nossos documentos curriculares ainda trazem um nível reduzido de pluralidade, no entanto, na dimensão real do currículo, a ação docente pode ser fundamental para a incorporação de outras Histórias na sala de aula. Acredito que a mobilização do conhecimento histórico e dos saberes pedagógicos juntos, pode ser uma potencialidade.

      Kenia Gusmão Medeiros

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  4. Bom dia. Sei que o texto de vocês acaba verticalizando para uma análise do pensamento de Deleuze e Guattari, mas o que me chamou particularmente a atenção, dada a atualidade, e também por conta das minhas leituras atuais, foi a questão dos refugiados, daquilo que Hannah Arendt chamava de apátridas e que foi tão importante para a reflexão dela. Como sei que vocês têm uma leitura profunda dela, gostaria que explicassem melhor o que seria esse arbítrio último para as questões internacionais (algo que, obviamente, apresenta problemas, como vemos pelas instituições internacionais)? Bem como, explicassem um pouco mais a ideia dela da humanidade vinculada ao direito a ter direitos? Questões tão importantes de serem discutidas hoje. Atenciosamente,
    Leandro Mendanha e Silva

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    1. Olá Leandro, tudo bem? Muito obrigado pela leitura atenta e pelas considerações. Na perspectiva de Hannah Arendt o "espaço público" era/é algo agônico e em constante transformação, mas bastaria uma ação ou discurso para que desmoronasse [como aconteceu na Alemanha durante a dominação totalitária]. Ainda com Arendt, a conservação do mundo público deveria ocorrer por meio de "garantias" e de "árbitros" [um resquício do pensamento liberal] que pudesse impedir, novamente, o sistema totalitário em um mundo em que esta nova forma de dominação destroçou as antigas formas de pensar e agir. Assim, "o direito a ter direitos" foi, necessariamente, o reconhecimento que há de se preservar no mundo público vários mundos privados e esta(s) ação(es) impediriam outros homens de se tornarem supérfluos ao ponto de aderirem as ideologias da violência, da dominação, do nacionalismo e do progresso histórico. Por fim, ela não acreditava em um governo mundial, mas num sistemas de conselhos, onde e quando, homens e mulheres pudessem debater para refutar, energicamente, a desumanização da condição de apátrida.
      Álvaro Ribeiro Regiani

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    2. Leandro, muito obrigada! Muito bom mais uma vez a gente se encontrar aqui. Acredito que "o direito a ter direitos" trata-se de uma expressão política sobre a ontologia que precede e sustenta a a percepção da condição humana.Assim,a noção do direito a ter direitos ampliada para as mais diferentes experiencias do espaço público e privado, relaciona-se em última instancia , com o "amor mundi", com o cuidado pelo o novo, com o respeito pela vida. Em síntese, tornar-se apátrida escancara a política enquanto separação, restrição de garantias fundamentais em função da construção identitária baseada em origens. Pensar a questão dos refugiados pela acepção de Arendt, constitui uma reflexão, no sentido de volta a si, do sujeito em sua vida prática, e contemplar a importância da política e do discurso público, na luta contra a banalidade da morte.

      Kenia Gusmão Medeiros

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    3. Agradeço as respostas de ambos. Venho de leituras de Agamben e Butler, ambos leitores, mesmo que diferentes, da Arendt, e ambos interessados na questão dos refugiados. Realmente a questão do espaço público e da natalidade são importantes contribuições de Arendt para nosso presente.Foi bom dialogar com vocês. Abraços.
      Leandro Mendanha e Silva

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  5. Boa noite Álvaro e Kenia,

    Excelente texto, parabéns.

    Gostaria de saber de que forma vocês acreditam que esses conteúdos podem ser tratados no ensino na escola e na academia evitando (re)produzir discursos eurocentricos e colonizadores?
    Esse discurso produz violências simbólicas de diversos modos, como vocês veem o papel da mídia na construção de desigualdades e na reprodução de imagens como a do início do texto?

    Matheus Oliveira de Paula.

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    1. Olá Matheus, obrigado pela leitura e pelas considerações. Em sala de aula, a utilização de qualquer mídia deve ser mediada pelos professores de modo a alcançar múltiplos usos didáticos e, sobretudo, críticos. Nesta mediação é necessário pensar a forma e o conteúdo epistemológico para uma crítica a valores eurocentrados. Por isso, o trato com os discursos ou com as mídias tem que se ancorar em epistemologias outras que não as europeias.
      Álvaro Ribeiro Regiani

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    3. Oi Matheus!Muito obrigada pela leitura, elogio e pergunta! Acredito que nos processos de Educação histórica, que predominantemente atendem um público de crianças e jovens, é preciso incluir fontes, linguagens e epistemologias diversas, assim podemos desconstruir um pouco da lógica eurocêntrica do modelo do quadripartite francês e dos nossos próprios documentos curriculares. Considerando que a consciência histórica não se desenvolve apenas no ensino formal, as mídias muitas vezes criam e reforçam perspectivas etnocêntricas e que alocam povos orientais em níveis culturais menores. São construções discursivas singelas, que podem passar despercebidas, mas que continuam colocando a Europa Ocidental como centro do mundo e verdadeira produtora de conhecimento e epistemologia. No caso da imagem do início do texto, identifico uma denúncia de um momento na História em que noções de cidadania pelo viés nacionalista, se sobrepõe ao direito humano de ter direitos. Se sobrepõe à vida. Nesse sentido, podemos ver outro papel da mídia, retirando-a de uma dicotomia de boa e má, mas demonstrando suas muitas vias, identidades, objetivos e manifestações.

      Kenia Gusmão Medeiros

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